Da minha janela

     Os outros escrevem poesias, esmeram-se em dissertações, exploram os sentimentos em função de palavras superficiais, incidem o complexo sob uma espécie de nitidez simplista...e fazem tudo o que eu não sei.
     Eles fazem parecer tudo tão fácil que até dói ao mero mortal ver o quanto o caminho aumenta quando somos nós a percorrê-lo.
     Mas os outros não sabem o que eu sei. Eles não viram o sol entrando, de manhã, pela minha janela, nem sentiram o frio na cara à saída da minha porta, não fazem ideia do peso da minha bolsa e não calcaram cada passada sobre o passeio. Não sabem nada disto e, apesar de tudo, julgam-se no direito de criticar a altura a que ergui a persiana, a palidez que apresento ao nascer do dia, o quanto me arrasto para baixo e a forma como empurro o chão, ou até a largura de cada passo.
     Um dia esquecerão tudo o que não quiseram verdadeiramente saber, ainda assim, eu irei relembrar. Nesse dia, irão observar o teu dia, apenas de fachada, com aqueles olhares que servem só para rapidamente confirmar, para, de seguida, prosseguirem com os seus juízos.
     Só espero, nesse dia, não ser um dos outros. Se o for, leva-me até à tua janela e diz-me que a luz que bate no vidro é a mesma que brilha lá fora.

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